12.5.12

Punição - o que é?

Se você é leitor do blog há algum tempo, sabe que eu não sou a maior fã de treino com correções físicas ou verbais. Tenho vários motivos para isso. Pensando historicamente, o primeiro motivo que me levou a retirar as punições do treino com os meus cães foi o enorme insucesso que eu tive com técnicas que se baseavam em correções ou controle aversivo. O meu primeiro cão, o Pypo, não gostava de outros cães e tinha tendências a agressividade. Graças a minha ignorância na época e a muitas e muitas sessões recheadas de punições, as tendências deixaram de ser tendências e passaram a ser exibições incontroláveis de agressividade. Chegou ao ponto de ele ver uma sacola a 500 metros de distância, achar que era um cachorro e começar a "surtar". Não era bonito de se ver. Nem de viver.

Obviamente, não podemos julgar um método pela sua má aplicação, isso vale tanto para os treinos com punições quanto para os treinos com reforçamento positivo. E com toda a certeza eu fazia uma péssima aplicação das punições.

No entanto, esse foi só o primeiro motivo que me levou a parar com as correções no meu treino. Com o tempo, consegui formular diversas razões práticas de por que não devemos treinar nossos cães com tais ferramentas. Mas, primeiro, tenho que esclarecer: o que é punição?


Definir punição não é algo simples de se fazer, como foi para definir o reforço positivo, por exemplo. Isso porque o reforço é definido por seus efeitos, mas a punição possui efeitos tão variados e imprevisíveis que fica muito difícil criar uma definição prática. O psicólogo B. F. Skinner acabou por definir punição como adição de estímulos aversivos (adição: logo chamamos de punição positiva) ou retirada de um estímulo apetitivo ou "prazeroso" (retirada: logo chamamos de punição negativa). Mas e seus efeitos?

O efeito mais conhecido da punição são as respostas emocionais. Quando somos punidos sentimos medo, ansiedade e, com o tempo, raiva. Punições geram respostas emocionais desagradáveis para o punido. Só aqui já temos razão o bastante para não utilizarmos tais práticas no adestramento. O treino e a vida não deveriam ser experienciadas com medo pelos nossos cães.

Mas, claramente, não paramos por aqui. O outro efeito da punição é o chamado contracontrole. O contracontrole é o nome dado aos comportamentos que o punido emite para evitar a punição. O grande problema é que é muito difícil prever como o punido irá "contracontrolar".

Pensem na seguinte situação: temos um filhote que acabou de chegar ao seu novo lar. Em dado momento, o cãozinho faz xixi em cima do tapete e o seu dono vem e briga com ele, faz os "Shh-Shh", "Ei, não!" e dá uns empurrões e tapinhas no filhote. Aquela rotina de sempre. O que o dono ensinou para o filhote? Que ele não pode fazer xixi no tapete? Que ele não pode fazer xixi quando o dono está presente? Que ele deve fazer o xixi no jornal? A última é a única que ele com certeza não ensinou.

Existem dois prolemas nessa situação. O primeiro é bastante lógico. Quando punimos um cão, ou uma pessoa, não estamos ensinando o que o cão (ou pessoa) deve fazer e sim o que não deve fazer. Como o cão saberá o que fazer na próxima situação? Ele não saberá. Isso só contribuirá para respostas emocionais como ansiedade.

Como colocar coleira de pinos para
funcionar,  ou seja, para machucar
O segundo problema é que não podemos predizer como o cão irá contracontrolar e esses comportamentos de contracontrole podem ser bastante ineficientes para o treino. O exemplo do xixi é bem claro nesse aspecto. Se punimos o cão quando ele faz xixi, ele pode simplesmente esperar que não estejamos no cômodo para poder fazer xixi. Agora você tem um cão que mancha os tapetes e que você não pode corrigir.

Mas os comportamentos de contracontrole podem não ser tão simples ou fáceis de lidar. O Pypo, por exemplo, ficou mais agressivo, mais ansioso e mais medroso. Já a Dory sempre foi muito sensível a punições que para outros cães seriam bem leves ou imperceptíveis. A forma mais comum de contracontrole da Dory era, e ainda é, fugir do trabalho, se afastar do agente punidor ou da situação que causa desconforto e se mandar. Como ensinar por punições um cão que simplesmente foge? Sei que existem meios, mas eu temo só de pensar.

Sendo assim, cientificamente falando, não faz sentido treinar um cão através de punições se existem outras alternativas (e eu já mostrei em outros posts que essas alternativas existem).

Em um próximo post vou explicar porque misturar metodologias (treino com reforço positivo e com punição) ainda é um mau negócio e bem menos efetivo que treinar apenas com  reforço positivo.



Dica: quem quiser estudar mais sobre o assunto, procure o livro "Coerção e suas implicações" de Murray Sidman. Um clássico e que trata todos os aspectos do assunto.

3 comentários:

  1. Excelente post! Eu já tive problemas com punições. A Bia e a Nica foram minhas duas primeiras cadelas que ensinei alguns truques, e utilizei algumas punições, que não serviam para absolutamente nada e não resolviam os problemas.

    Porém, como vc mesma disse, é bem complicado falar de punições e reforços positivos. Criadores de pastores alemães dizem que, em treinos de proteção, são aplicadas punições fortíssimas, e para os cães aquilo é um "nada". Acho que o ideal é achar um "ponto de equilíbrio" para cada cachorro. Conheço cães que são mega sensíveis, e cães que podem apanhar e serem espancados que para eles aquilo será apenas diversão. Mas... não entendo quase nada de punições e comportamento canino, então prefiro não opinar muito a respeito rsrs

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    1. Na verdade Taís, os cães podem ser dessensibilizados para não se sentirem punidos por certos estímulos. Nesses casos, o cão não estará sendo punido porque ele não vê esse estímulo como aversivo :D

      A Dory, por exemplo, morria de medo de pés! Imagina só que desgraça. Se eu me embananasse no agility e tropeçasse nela, ela ficava absolutamente aterrorizada! Entao, junto com o treino de brinquedo, eu fui dessensibilizando ela para esses "chutes" e "trancos". Hoje, eu dou umas baitas porradas nela durante o cabo de guerra, grito, chuto (nao com força né! hahaha) e ela nem liga, pelo contrario, ela fica mais louca ainda no cabo-de-guerra! Mas porque ela aprendeu a não ver essas situações como assustadoras.

      Ou seja, hoje, mesmo eu parecendo maltratar minha cachorra durante o cabo-de-guerra, eu só estou treinando ela com reforço positivo! :)

      Está aí a diferença. Não importa qual o estímulo e sim, como o cão se sente em relação a esse estímulo.

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